domingo, 26 de dezembro de 2010

THOMAS DE LA RUE – VIDEO 1960

                                                                                       © 2010 Marcio Rovere Sandoval


Fig. 1 – Anverso da cédula de 20 cruzeiros da 2ª Estampa, série 1351ª (1960), emitida pelo Tesouro Nacional – Brasil (P.160d) e impressa por Thomas de La Rue & Company, de Londres.

Encontramos na internet um vídeo muito interessante sobre a impressão de papel-moeda.
O site em questão é o Britihs Pathé, que vende vídeos antigos.
O vídeo data de 31/07/1960, o título é "Money Markers" (Fabricantes de Dinheiro).
Este vídeo trata do processo industrial de fabricação de papel-moeda, desde parte da concepção da cédula até uma eventual destruição por falha na impressão. No vídeo não é mencionado o nome da empresa, apenas que se trata de uma impressora de papéis de segurança (Security Printers) de Londres. O vendedor (Britihs Pathé) informa que existe uma indicação (em uma das máquinas) do "nome do impressor" Waterlow & Sons de Londres, levando-o a concluir que se trata desta empresa, que como veremos é uma conclusão precipitada.

Veja o vídeo e observe nosso roteiro abaixo. (clique aqui para ver o vídeo).






Fig. 2 – Prova de anverso da cédula de 20 cruzeiros da 2ª Estampa do Tesouro Nacional – Brasil, impressa por Thomas de La Rue & Company, de Londres. 

Parte 1 – Vemos primeiramente um funcionário da empresa em sua mesa de trabalho (Ateliê de concepção de cédulas bancárias) com material artístico apropriado. Ele mede a “cédula” (prova em papel cartão) e faz alguns retoques a pincel. Trata-se de uma cédula de 20 cruzeiros da 2ª Estampa do Tesouro Nacional – Brasil (no caso a prova desta cédula), que foi impressa pela Thomas de La Rue de Londres. Esta cédula da Thomas de La Rue já vinha circulando desde 1950. Esta prova que aparece na imagem seria de 1960 ou anterior eis que é possível ver a anotação “valor recebido” abaixo do medalhão que traz a efígie do Marechal Deodoro da Fonseca (Fig. 2). Se a data da produção do vídeo estiver exata, poderíamos dizer com certeza que se trata da cédula de 20 cruzeiros de 1960, eis que a emitida em 1962, desta mesma estampa, traz o indicativo diferente, ou seja, “valor legal”.

Parte 2 – Na seqüência temos a gravação em talho doce (calcografia) do busto da Rainha Elizabeth II da Inglaterra, que foi utilizado em diversas cédulas impressas pela Thomas de La Rue. (Fig. 3 e 4).


Fig.3 e 4 – À direita temos a gravação em calcografia do busto da Rainha Elizabeth II da Inglaterra e após detalhe do anverso da cédula de 25 rúpias das Ilhas Mauricio (P.32b) de 1967, impressa por Thomas de La Rue, em que se utilizou uma gravura semelhante a que aparece no vídeo. 

Parte 3 – O funcionário realiza a gravação em chapa de aço amolecido em uma prensa de transferência. Esta prensa contém a referencia a Waterlow & Sons, que também era um impressor londrino de papel-moeda. Em 1961, esta empresa foi adquirida pela Thomas de La Rue (a parte referente ao papel-moeda).

A gravação que esta sendo realizada refere-se à também brasileira cédula de 50 cruzeiros da 2ª Estampa do Tesouro Nacional, de 1960 ou anterior. (Fig.5)


Fig. 5 – Anverso da cédula de 50 cruzeiros impressa pela Thomas de La Rue (P. 179) de 1963, semelhante à mencionada no vídeo, pertence à mesma estampa, mas esta tem ligeiras diferenças, além das microchancelas, temos ainda que a indicação "valor recebido" foi alterada para "valor legal".

Parte 4 – A mesma situação anterior, agora (ao que parece – não temos certeza) com uma cédula de 10 libras da Irlanda, a máquina também é da Waterlow & Sons (Fig.6).


Fig. 6 – Anverso da cédula de 10 libras da Irlanda (P.66c), de 1973. Esta cédula não traz o nome do impressor e o mesmo não consta nos catálogos. Imagem obtida na internet


Parte 5 – A impressão das cédulas e sua retirada da impressora.
Parte 6 – O controle da impressão – a funcionária examina a folhas e retira uma que apresenta dupla impressão em um dos cantos. Aqui se trata de uma cédula do Chartered Bank de Hong Kong no valor de 10 dólares (P.64), datada de 9-4-1959, esta impressa por Waterlow & Sons (Fig.7 e 8).


Fig. 7 – Folha de cédulas com impressão sobreposta (defeituosa), do Chartered Bank de Hong Kong, no valor de 10 dólares (P.64), datada de 9-4-1959, esta impressa por Waterlow & Sons.



Fig. 8 – Anverso da cédula de 10 dólares Chartered Bank de Hong Kong (P.70c) impressa pela Thomas de La Rue, de 1962-70 , ela é semelhante a anterior, impressa pela Walterlow & Sons, que consta no vídeo, que todavia não dispomos nem da cédula e nem de uma imagem em boa qualidade. Esta imagem foi retirada da internet

Parte 7 – Exame manual das cédulas, como a anterior, mas agora já cortadas, se trata da cédula de 1 quetzal, da Guatemala, de 1960, também impressa por Waterlow & Sons (Fig. 9).


Fig. 9 – Anverso da cédula de 1 quetzal da Guatemala (P.43a) de 1962, semelhante a que aparece no vídeo. Esta mesma estampa passa a ser impressa pela Thomas de La Rue em 1964. Imagem obtida na internet.

Parte 8 – Queima de maços de cédulas (provavelmente defeituosas) e de folhas de cédulas. Um funcionário faz a conferência e faz anotações, enquanto o outro se encarrega de jogar dentro do forno o material rejeitado. Esta última ainda não conseguimos identificar, é possível ver o valor, 10 no reverso e a cor, ocre.

Obs. A Thomas de La Rue & Company, Limited, ou simplesmente De La Rue (na sua denominação moderna) adquiriu em 1961 a empresa Warterlon & Sons (a parte referente ao papel-moeda). Ao que parece, mesmo antes da data de formalização da venda, a De La Rue já vinha utilizando os matérias da Warterlon & Sons.

Autor: Marcio R. Sandoval (sterlingnumismatic@hotmail.com)

© 2010 Marcio Rovere Sandoval

domingo, 19 de dezembro de 2010

ARAUCÁRIA – PINHEIRO-DO-PARANÁ

                                                                                  © 2010 Marcio Rovere Sandoval


Araucárias – foto de Marc Ferrez (c.1884)

A seguir apresentamos uma pequena matéria sobre a araucária (pinheiro-do-paraná), de autoria de Antônio Claret Karas, que apesar de ter sido realizada em 1993, ainda se apresenta atual. A madeireira conhecida como Lumber (Southem Brazil Lumber Colonization Company), de origem norte-americana, se instalou no município de Três Barras em Santa Catarina em 1911. Era a maior madeireira da América do Sul. A Lumber ainda possuía uma outra unidade em Calmon, esta bem menor. A ferrovia São Paulo-Rio Grande foi concluída em 1910 e a Guerra do Contestado (1912-1916), também está inserida neste contexto. A exploração industrial em grande escala da araucária entrou em decadência na década de 60/70 com o esgotamento comercial da floresta. Em 2005/2006 foram criadas unidades de conservação das pouquíssimas áreas remanescentes.
Lembramos aqui que a etimologia da palavra Curitiba significa em tupi ku'ri 'pinheiro' + tïwa 'muito, abundância.
PRESERVAÇÃO – ANTÔNIO CLARET KARAS (*)
"A historia das araucárias é um caso clássico e melancólico da possível extinção em menos de um século de uma espécie de grande porte. Há 84 Anos instalou-se no município de Três Barras, em Santa Catarina, um projeto de colonização da empresa inglesa Southem Brazil Lumber Colonization Company, em nome de objetivos que continuam a vigorar quase um século depois: a ocupação territorial. Em 40 anos de atividades, o projeto Southern Brazil dizimou mais de 3 milhões de pinheiros centenários, e para cada árvore derrubada nem sequer uma roseira foi plantada. A floresta de araucária - nome dado à floresta ombrófila mista - é caracterizada pela presença da Araucária angustifolia. Esta dominância na paisagem paranaense foi tão marcante que a espécie recebeu o nome de pinheiro-do-paraná, fazendo parte da cultura do estado. No inicio da década de 50, o Paraná possuía cerca de 7,3 milhões de hectares de formações florestais de araucária, que representavam aproximadamente 40% da área dos pinhais do país. O restante se dividia entre Santa Catarina (31%), Rio Grande do Sul (25%) e São Paulo (3%). Desses milhões de hectares restam hoje pouco mais de 85 mil, ou 1,2% da cobertura vegetal original. A construção das ferrovias viabilizou num prazo de cem anos, o escoamento e o rápido esgotamento das árvores que dominavam a paisagem do Paraná desde a última glaciação, há cerca de 20 mil anos. A Fundação SOS Mata Atlântica detectou recentemente um total de 144 mil hectares desmatados no Paraná, entre 1985 e 1990, a maior parte dos quais nas áreas principais de ocorrência de floresta de araucária. Atualmente, somente 40.774 hectares com Mata Araucária encontram-se protegidos em 17 unidades de conservação, perfazendo um total de 0,22% da população original. Não faltam leis ou instrumentos jurídicos para a conservação dos remanescentes florestais de araucárias, mas ações determinadas, apoiadas na firme vontade de agir, se fazem necessárias. A inexistência de uma política ambiental efetiva também contribui para a eliminação destes remanescentes descontínuos e fragmentados. Até o momento, os procedimentos aplicados e a fiscalização sobre os "Planos de Manejo Sustentado", exigidos pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), têm sido insuficientes para a conservação da araucária. E bom lembrar que nenhum país latino-americano considera o valor da árvore em pé. E a madeira da araucária ainda consta da pauta de exportações brasileiras. Muitos problemas têm sido evidenciados, acarretando uma pressão cada vez maior sobre os remanescentes. O setor produtivo carece de informações técnicas sobre manejo florestal, bem como sobre a viabilidade econômica a médio e longo prazo. Onde ficam as políticas extensionistas e de assistência técnica dentro da atual política ambiental? Desconhecem-se os benefícios indiretos das florestas de araucária, faltam unidades de conservação e incentivos á prática conservacionista. A tributação é inadequada e o pouco conhecimento da legislação convive com a falta de maior rigor nos ações fiscalizadoras e punitivas. Uma política séria para a conservação da floresta de araucária, que vise a sua perenização e á obtenção de benefícios econômicos e sociais, precisa contemplar instrumentos como o manejo sustentado, o uso múltiplo da floresta e a preservação restrita. Esse conjunto de procedimentos deve ser conduzido com o objetivo de se evitar que a araucária subsista apenas na lembrança da atual geração, nos parques, nas fotografias ou em símbolos e pinturas. Não haverá uma segunda chance para a perda deste patrimônio genético e ecológico".
(*) Antônio Claret Karas é engenheiro florestal da Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Araucária – Paraná (in, Revista Ecologia e Desenvolvimento, Ano 2, nº 31, setembro de 1993).


Detalhe de uma apólice de cem dólares da “Brazil Railway Company” (c. 1910), impressa pela empresa inglesa Waterlow & Sons Limited. (clique para ampliar)

Veja os vídeos antigos sobre a Lumber: I, II, III, IV. (clique para ver).

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

CAMBOJA

                                                                                    © 2010 Marcio Rovere Sandoval



Cédula de 1000 riels (c.1974) do Banco Nacional do Camboja (P.17) 185 X 88 mm, impressa pela Bradbury, Wilkinson & Co. Lo., New Malden, Surrey, Inglaterra. No anverso temos crianças na escola e no reverso “Lokeçvara at Ta Som”, provavelmente parte de Angkor. Esta cédula não chegou a ser emitida. (clique na imagem para ampliar)

Esta cédula faz parte de um conjunto de quatro cédulas do regime do Khmer Vermelho (República Khmer), liderado por Paul Pot (1975-1979). A serenidade expressa nesta cédula não condiz com a realidade, já que neste Governo pereceram mais de dois milhões de cambojanos.


Detalhe do reverso da cédula de 500 riels (1973-75) do Banco Nacional do Camboja (P.16) 183 X 86 mm, impressas pela Thomas de La Rue. Provavelmente se trata de um relevo de Angkor, com cenas da vida cotidiana. (clique na imagem para ampliar)

Estas e as demais cédulas emitidas pelo Banco Nacional do Camboja podem ser visualizadas no respectivo site. (clique no nome do banco).

Autor: Marcio R. Sandoval (sterlingnumismatic@hotmail.com)

© 2010 Marcio Rovere Sandoval

A TIPOGRAFIA NO BRASIL – PARTE IV (IMPRENSA RÉGIA)

Tipografia, ilustração do livro de Jost Amman e Hans Sachs, Eygentliche Beschreibung aller Stände auff Erden, hoher und nidriger, geistlicher und weltlicher, aller Künsten, Handwercken und Händeln ...Durch d. weitberümpten Hans Sachsen gantz fleissig beschrieben u. in teutsche Reimen gefasset, Frankfurt am Mayn: Feyerabend, 1568, [120 Bl.].

6 – “Saiba o mundo, e a posteridade, que, no ano de 1808 da era cristã, mandou o governo português no Brasil, buscar à Inglaterra uma impressão, com os seus apéndiculos necessários, e a remessa que daqui se lhe fez importou em 100 libras esterlinas!!! Contudo diz-se que aumentará esse estabelecimento, tanto mais necessário quanto o governo ali nem pode imprimir as suas ordens para lhes dar suficiente publicidade. Tarde, desgraçadamente tarde: mas, enfim, aparecem tipos no Brasil; e eu de todo o meu coração dou os parabéns aos meus compatriotas brasilienses”. Eis como Hipólito da Costa saudou no 5° número do seu periódico[1] o estabelecimento no Rio de Janeiro da Impressão Régia. No número imediato, transcreveu o respectivo decreto, datado de 13 de maio de 1808[2], brindou com elogios o seu autor, o ministro D. Rodrigo de Sousa Coutinho[3], a seguir conde de Linhares, e registrando a notícia, aliás falsa, de que a tipografia oficial se estamparia toda e qualquer obra, defendeu ardorosamente a liberdade de imprimir.[4]


[1] Correio Brasiliense, I, 394.

[2] “Tendo-me constado que os prelos que se acham nesta capital eram os destinados para a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, e atendendo à necessidade que há de oficina de impressão nestes meus Estados, sou servido que a casa onde eles se estabeleceram sirva interinamente de Impressão Régia, onde se imprimam exclusivamente toda a legislação e papéis diplomáticos, que emanarem de qualquer repartição do meu Real Serviço, ficando inteiramente pertencendo o seu governo e administração à mesma Secretaria. Dom Rodrigo de Souza Coutinho, do meu Conselho de Estado, ministro e secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, o tenha assim entendido, e procurará dar ao emprego da oficina a maior extensão, e lhe dará todas as instruções e ordens necessárias, e participará a este respeito a todas as estações o que mais convier ao meu Real Serviço. Palácio do Rio de Janeiro, em 13 de maio de 1808”.

[3] Elogios merecidos. Um grande ministro, D. Rodrigo. Afilhado de Pombal, entrou na diplomacia em 1778, ao iniciar-se a “viradeira”. Em 1796 chegava aos cargos de governo. Monarquista prático, era intelectualmente adepto do constitucionalismo britânico, chefiando o chamado partido inglês em oposição ao francês dirigido por António Araújo. Estadista ao modo pombalino, foi um infatigável trabalhador. Dele partiram, ou tiveram a sua colaboração, todas as providências assentadas no Rio de Janeiro de 1808 a 1812. Aliás a colônia americana merecera sempre sua atenção. Antes de 1800 elaborara um largo plano, modificando o sistema de cobrança dos impostos, atenuando aos tributos sobre a importação, abolindo a moeda provincial, liberando os distritos diamantinos, reduzindo de metade o quinto do ouro, extinguindo o estanco do sal, isentando de direitos artigos estrangeiros, inclusive o aço e o ferro, estabelecendo correios de terra e aumentando as loterias. (V. o respectivo texto em Marquês de Funchal, o Conde de Linhares, 44). Semelhante plano, como outros projetos de D. Rodrigo, excediam a capacidade administrativa do tempo e a incurável madraçaria de D. João. Por isso, fazia-se-lhe a crítica de não se ocupar suficientemente dos detalhes dos seus empreendimentos, “demasiadamente gigantescos em relação aos meios executórios de que dispunha”. Seriam certamente os seus inimigos que diziam “ter ele na cabeça as primeiras linhas de todos os artigos de uma enciclopédia”. (Saint-Hilaire, Voyage dans les provinces de Rio de Janeiro et de Minas Gerais, I, 92.) Faleceu este grande português, no Rio, a 26 de janeiro de 1812.

[4] – I, pág 517 V. os primeiros diplomas sobre a Impressão Régia no Boletim Bibliográfico da Imprensa Nacional, ns. 1 a 7.

D. Rodrigo de Sousa Coutinho, Conde de Linhares (1755/1812).

O material gráfico não fora, como disse Hipólito, adrede comprado para a oficina do Rio. Adquirira-o, e não tivera tempo de montá-lo em Lisboa, a Secretaria de Estrangeiros e da Guerra, e viera parar na Colônia sem ciência do governo. Foi António de Araújo, o futuro conde da Barca,[1] então titular daquele Ministério, quem, na precipitação da fuga, lembrou-se de trazê-lo consigo no porão da “Medusa” e, chegando ao Rio, mandou instala-lo nos baixos de sua residência, na Rua dos Barbonos.


[1] António de Araújo de Azevedo, o corifeu do partido francês, antagonista, portanto, de D. Rodrigo, foi o mais brasileiro dos estadistas portugueses. Tendo chefiado missões diplomáticas, inclusive em Paris, assumiu em 1804 o Ministério de Estrangeiros e da Guerra até a retirada da corte para o Brasil. Consigo, na “Medusa”, além da mencionada tipografia, trouxe para a Colônia a sua livraria, mais tarde integrada na Real Biblioteca, uma coleção mineralógica organizada pelo célebre Werner e diversos petrechos de laboratório. Excluído do governo, por força da situação internacional, Araújo devotou-se de 1808 a 1814 a iniciativas científicas e artísticas. Na sua casa da Rua do Passeio, instalou-se, além da tipografia, uma oficina para o fabrico de porcelana, um laboratório de química para experiências com plantas nativas, e um alambique do tipo escocês, que lhe permitia destilar, além da “água de Inglaterra”, outros medicamentos de largo consumo. Cultivava no seu quintal cerca de 1.400 espécies de plantas nacionais e exóticas, catalogadas no “Hortus Araujensis”, obra inacabada, segundo uns, completa e publicada segundo Ferdinand Denis, mas de qualquer modo extraviada. Instituiu a “Sociedade Auxiliadora da Indústria e da Mecânica”, de vida longa. Dois anos depois da morte de Linhares, D. João nomeou-o ministro da Marinha e Ultramar, provocando desagradável incidente com Lord Strangford. Politicamente, o seu ato mais importante foi o da elevação do Brasil à categoria de reino. Organizou o teatro lírico do Rio, importando cantores italianos e, criou a Escola de Belas Artes, inaugurada muito depois da sua morte. Importou um engenho de serrar madeira, desenvolveu o Jardim Botânico e encetou a cultura do chá com sementes trazidas de Macau por Luís de Abreu e chineses especialistas. Que outro português, a não serem Pombal e Bobadela, apresenta igual rol de benefícios ao Brasil? “Que os bons serviços que prestou à causa da civilização em geral – disse de Barca o seu único biógrafo brasileiro, Meneses Brum (Na. Bibl. Nac., Vol II, fasc. I, 20) – dão-lhe direito a uma menção honrosa na História; mas os prestados ao progresso e à civilização do Brasil em particular, fazem a sua memória grata aos brasileiros e nos impõe o dever de inscrever seu nome imorredouro entre os homens ilustres e benfeitores da Terra de Santa Cruz”. Antônio de Araújo faleceu ocupando todas as pastas, aos 65 anos, a 21 de junho de 1817. Não tinha família. Fazendo-lhe o necrológico no O Português, João Bernardo da Rocha, depois de citar uma frase característica de Barca - “faço o que posso, mas não posso o que desejo” – , alude aos seus dois fundamentais erros: a funesta expedição de Montevidéu “e o sistema pródigo de destruir Portugal para aumentar o Brasil: Deus lho perdoe”. (Idem, 19).

Antonio de Araújo de Azevedo (1752/1817), Conde da Barca. (Gravura de Pradier, da Missão Artística de 1816).

O teor do decreto instituidor da Impressão Régia não deixa dúvida a respeito, porquanto ali se diz “constar” acharem-se “nesta capital” os prelos “destinados a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, pelo que se mandava servisse interinamente de Impressão Régia “a casa onde eles se estabeleceram”. O expediente de António de Araújo reverteu em ótimo achado para D. Rodrigo.

A administração da Impressão Régia coube, pela decisão de 24 de junho de 1808, a uma Junta composta de José Bernardes de Castro, oficial da Secretaria de Estrangeiros e da Guerra, Mariano da Fonseca, o antigo consócio de Silva Alvarenga na jacobina Sociedade Literária, e Silva Lisboa.

Competia-lhe, conforme o regimento baixado na mesma data, afora a gerência da oficina, “examinar os papéis e livros que se mandassem publicar e fiscalizar que nada se imprimisse contra a religião, o governo e os bons costumes”.[1] Era a censura prévia, a que logo se daria feição adequada. (in, Rizzini, Carlos. O Livro, o Jornal e a Tipografia no Brasil: com um breve estudo geral sobre a informação. São Paulo: Impressa Oficial do Estado, Edição fac-similar, 1988, p. 315-317) (grifo nosso).

Da Biblioteca Nacional temos:

“Foram navios britânicos, da Armada de Lord Nelson, que escoltaram até o Rio de Janeiro as maquinas da primeira tipografia oficial do Brasil. A tipografia era nova. Embarcada para Portugal, chegam a Lisboa na véspera da partida da Corte para o Brasil. Às pressas voltaram a um navio, o Medusa, que desembarcou no Rio de Janeiro em 7 de março de 1808. Entre a chegada do navio e a primeiro obra impressa passaram-se pouco mais de dois meses. Se o padre Perereca exultou (“O Brazil até o feliz 13 de Maio deo anno de 1808 não conhecia o que era Typographia: foi necessário que a brilhante Face do Príncipe Regente Nosso Senhor, bem como o refulgente Sol, viesse vivificar este Paiz”, Hipólito José da Costa não esconde o estarrecimento (“O mundo talvez se admirará que eu vá enunciar, como uma grande novidade, que se pretende estabelecer uma imprensa no Brazil; mas tal é o facto).

(in, Herkenhoff, Paulo. Biblioteca Nacional – A História de uma Coleção. Rio de Janeiro: Editora Salamandra, 1997, p. 81).

Obs.: O primeiro trabalho da Imprensa Régia foi a "Relação dos Despachos Publicados na Corte pelo Expediente da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra..." de 13 de maio de 1808, um folheto de 27 páginas.


[1] Em 1818 a fábrica de cartas foi entregue em arrendamento a Jaime M. Vasconcelos & Cia., por nove anos e mediante a anuidade de oito contos. Em 1823 rescindiu-se o contrato e meses depois punha-se termo ao monopólio dos baralhos.

domingo, 21 de novembro de 2010

CAIXA ELETRÔNICO – BANCO PORTUGUÊS DO BRASIL S.A.

                                                                                  © 2010 Marcio Rovere Sandoval

Fig.1 - Informe publicitário do “Banco Português do Brasil S.A.”, in Seleções Reader`s Digests, junho de 1970, p.123.

Os primeiros Caixas Eletrônicos foram fabricados por De La Rue e instalados pelo Barclays Bank num bairro de Londres em 1967. A invenção é devida a John Sheperd-Barron (1925-2005) um escocês, nascido na Índia e que trabalhava para a De La Rue. O armênio-americano Luther George Simjian patenteou em 1963 uma máquina semelhante denominada Bankograph que foi instalada em caráter experimental em Nova York em 1961, pelo City Bank of New York, sendo retirada seis meses depois por falta de aceitação dos clientes. Esta máquina aceitava depósitos, mas não distribuía dinheiro.
No Brasil os primeiros Caixas Eletrônicos seriam de 1983, instalados pelo Bradesco e pelo Itaú. (clique para ver o vídeo)
No entanto, o informe publicitário acima demonstra que a utilização do caixa eletrônico, ou algo semelhante, já havia sido colocado em operação no Brasil.
O "Banco Português do Brasil" foi fundado em 1918 e funcionou até 1974, data em que foi fusionado com o Banco Itaú. Veja o antigo prédio do Banco em São Paulo e uma publicidade de 1944 (clique para ver).
Vejamos a publicidade:
"Enquanto a cidade dorme, o Caixa Corujão do Banco Português paga."
Na imagem temos uma cédula de 10 Cruzeiros-Novos da 2ª Estampa, superimpressão sobre 10.000 cruzeiros, impressa por Thomas De La Rue. (período de circulação dez. 1967 a 30/06/1975), micro-chancelas do Ministro da Fazenda – Antonio Delfim Netto e do Presidente do Banco Central – Ernane Galvêas. Veja uma matéria nossa sobre este assunto no Boletim da AFSC n° 57.


Fig.2 - Anverso da cédula de 10 cruzeiros novos emitida pelo Banco Central (1967-1975). Esta é da mesma estampa daquela que foi utilizada na publicidade acima (Série 1331ª), difere apenas em relação ao Presidente do Banco Central que naquela ocasião era Ernane Galvêas e nesta é Ruy Leme. Veja na margem branca a marca da empresa impressora, Thomas De La Rue & Company, Limited. Depois desta cédula vieram as primeiras cédulas impressas pela Casa da Moeda do Brasil.

"Nós chamamos o nosso Caixa Automático de Caixa-Corujão porque êle não dorme nunca:
Trabalha 24 horas por dia, durante os sete dias da semana.
Não respeita domingo nem feriado.
Isso quer dizer que êle nunca vai deixar um cliente do Banco Português na mão.
É só você colocar no Caixa-Corujão o cartão de identificação fornecido pelo Banco e o dinheiro cai na sua mão.
Sem você dizer uma palavra.
Mas o Caixa-Corujão não faz nenhum favor pra você, quando enche o seu bôlso de dinheiro.
Esse e um direito que você conquistou, quando abriu a sua conta no Banco Português do Brasil."




Fig. 3 - Publicidade do Banco Português do Brasil S.A de maio de 1970 – Seleções do Reader`s Digest, p.6.  Aqui aparece a chave (cartão) da “Caixa Pagadora” que funciona de “domingo a domingo”, ou seja, 24 horas.


Esta publicidade do Banco Português do Brasil S.A é do mês anterior à publicidade da primeira imagem (fig.1). A nomenclatura utilizada é “Caixa Pagadora” (Caixa Eletrônico), Chave (Cartão), De manhã, à tarde e de madrugada (Caixa 24 horas). No mês seguinte (fig.1) já temos o Caixa Automático (Caixa Eletrônico) que eles chamam também de “Caixa Corujão” e a informação que ele trabalha “24 horas por dia durante os sete dias da semana”.
Na primeira imagem fala-se em “Cartão de Identificação” (Cartão), nesta que é do mês anterior ainda é utilizado o termo “Chave”.     

Se alguém tiver mais informações sobre os Caixas Eletrônicos do Banco Português do Brasil, ou mesmo de qualquer outro banco que tenha utilizado Caixas Eletrônicos antes de 1983, entre em contato conosco pelo nosso email: sterlingnumismatic@hotmail.com

Autor: Marcio R. Sandoval (sterlingnumismatic@hotmail.com)

© 2010 Marcio Rovere Sandoval

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

LATÉCOÈRE – AÉROPOSTALE – AIR FRANCE - II

                                                                                            © 2010 Marcio Rovere Sandoval




“Tendo em vista que os especialistas afirmam que nossa idéia é irrealizável, não nos resta que uma coisa a fazer: realiza-la” Pierre Georges Latécoère, setembro de 1918.
Pierre Latécoère foi o criador das “Lignes aériennes Latécoère”, empresa que em 1926 passou a se chamar “Compagnie Génerale Aéropostale” e que finalmente, em 1933, foi absorvida pela recém criada Air France.


Um biplano Salmson que foi utilizado para cumprir a etapa em direção à Espanha (25 de dezembro de 1918). Estes aviões haviam sido utilizados na Guerra (1ª Guerra Mundial), depois foram colocados a disposição, pelo Estado, a Pierre Latécoère que os fez adaptar para utilização comercial, no entanto, eles se revelaram pouco rentáveis. A partir daí passaram ao Bréguet 14.


Um Bréguet 14, com um potência de 300 cv (motor Renault). Estes aviões haviam sido, igualmente, utilizados na Guerra. Pierre Latécoère obteve 15 deles. Eles voavam a 120 Km/h. Sob as asas (veja na foto) foram colocadas duas caixas onde eram alojados os malotes do correio.


No Aeródromo de Montaudran, os Bréguet 14, entregues pela Arma Francesa. Os suportes das metralhadoras não haviam ainda sido desmontados. Atrás, à direita (veja a seta) encontra-se estacionado um Laté 15, que após os ensaios obteve resultados deploráveis: o motor de 270 cv estava sujeito a freqüentes falhas. No fundo, à esquerda, um alinhamento de Laté 17: equipados do mesmo motor que o Bréguet 14, eles haviam o defeito de pousar muito rápido.


A senhora Vanier, primeira passageira da linha Toulouse-Barcelona, em 24 de outubro de 1920.


Laté 14.


3 de maio de 1923, o Capitão Rog tem sua filha nos braços e esta preparado para decolar de Casablanca (Marrocos) como chefe de uma missão de 3 Bréguets 14, pilotados por Delrieu, Cueille e Hamm, cuja missão é fazer o reconhecimento do prolongamento da linha até Dacar.


Rabat (Marrocos), 9 de março de 1919. O piloto Lemaître, em pé, acompanhado de Pierre Latécoère. Após o vôo de reconhecimento da linha França-Marrocos, o serviço postal regular foi aberto em 1° de setembro de 1919. Duas, três, depois quatro viagens por semana antes de se tornar quotidiana em outubro de 1922. A ligação durava trinta e seis horas no verão e sessenta horas no inverno.


Traçado da missão de Rog, reconhecimento da linha Casablanca – Dakar, sobrevoando os enclaves espanhóis da época.


Na rota de Dacar, Cabo July. "Sobre a costa nua, um pequeno forte de um branco sujo. Em volta, nenhuma casa, nenhuma árvore, nem mato" (J. Kessel, Mermoz). Foi necessário uma carta do Marechal Lyautey, trazida por Didier Daurat ao Coronel Bens (comandante da guarnição espanhola) para abrir as portas do forte a equipe francesa.


Após o transporte do correio, se pensava transportar passageiros, com um certo conforto. Desta forma é que foi adaptado o Bréguet 14 "Limusine" e, desde 1924, o Laté 17 que foi o primeiro monoplano com ventilação e aquecimento. Ele levava cinco passageiros.


Reparação de um motor no deserto, o dromedário servindo de plataforma.


O avião de Chevallier em pane no deserto.


Após sete dias em Buenos Aires, Lafay e Vachet partem para o Rio onde aterrizam cinqüenta e seis horas depois, vinte horas a mais do que a viagem de ida, por causa do mau tempo.


Agência da Aeropostale em Buenos Aires, esquina da Diagonal Norte com Florida.


Veículos de entrega da Aéropostale.


A Companhia instala em toda rede sul-americana uma infra-estrutura radioelétrica. Aqui, Natal – RN. A utilização da "T.S.F" permitia a comunicação entre as escalas e o contato através de rádio com os pilotos em vôo.


Um outro eixo de desenvolvimento foi aberto em direção à linha do Chile depois da superação da Cordilheira dos Andes. A travessia da Cordilheira pelos trens era interrompida durante os cinco meses de inverso (da páscoa a outubro).


Aéropostale – Santiago do Chile.


O Laté 28. A cabine de um Laté28 adaptada para oito passageiros.


Primeira grande série de aviões civis: mais de cinqüenta exemplares do Laté 28 foram colocados em serviço na França e na América do Sul.


Em 7 de outubro de 1933, no aeroporto de Bourget teve lugar a fundação da companhia Air France, nascida da fusão de quatro companhias: Air Orient, Air Union, a Cidna e a CGTA (Farman) e da compra da “Compagnie Génerale Aéropostale”. Na presença de muitas personalidades temos um grupo de aviões que portam a marca da Air France, da esquerda para a direita temos, um Laté 28 e dois LéO 213.


O Blériot 5190 "Santos Dumont" avião postal transatlântico de um peso total de 22 toneladas equipado de quatro motores Hispano de 650 cv, podendo transportar 600 kg de correspondências por 3200 km. Este avião fez 38 travessias do Atlântico.
Em 1928, o Governo francês havia comandado três hidroaviões transatlânticos: o Laté 300, o Blériot 5190 e o LéO 47, que tiveram diversos problemas no decorrer dos testes. Em junho de 1933, o Laté 300 "Cruz do Sul" estava pronto. Em três de janeiro de 1934, uma equipe da marinha nacional sob as ordens do Comandante Bonnot, ligaram Saint-Louis (Senegal) a Natal (Rio Grande do Norte) em dezenove horas de vôo e depois prosseguiram até o Rio de Janeiro.


Farman 220 (tipo Centauro), derivado de um avião de bombardeio, equipado de quatro motores Hispano de 600 cv, ele foi colocado em serviço em 1935, no Atlântico Sul.


Guillaumet e Saint-Exupéry a bordo de um Farman "Centauro"


Mapa da linha estabelecida pela Aéropostale.


Trimotor Bréguet 393 T, colocado em serviço em 1935 na linha Buenos Aires – Santiago do Chile. Veja o símbolo da companhia Air France sob a asa.


Comandos Bréguet 393 T
Obs.:O texto foi em grande parte traduzido da obra de Jean-Gérard Fleury “L`Atlantique Sud de L`Aéropostale à Concorde”, Edições Denoël, 1974. As fotos são da obra indicada, que foram tiradas pela tripulação e por amadores sem o acabamento que lhes daria um profissional.
Veja a primeira parte desta matéria.


Tradução: Marcio R. Sandoval
Marcio R. Sandoval (sterlingnumismatic@hotmail.com)
© 2010 Marcio Rovere Sandoval